“Fazem tanta falta cavalos brancos soltos em Brasília.
De noite eles seriam verdes ao luar”.
Foto tirada no Eixo Monumental de Brasília, em 2010.
Texto de Clarice Lispector, em 1962:
“Só Deus sabe o que acontecerá em Brasília. É que aqui o acaso é abrupto
– Brasília é mal-assombrada. É o perfil imóvel de uma coisa.
– De minha insônia olho pela janela do hotel às três horas da madrugada. Brasília é a paisagem da insônia. Nunca adormece.
– Aqui o ser orgânico não se deteriora. Petrifica-se.
– Eu queria ver espalhadas por Brasília quinhentas mil águias do mais negro ônix.
– Brasília assexuada.
– O Primeiro instante de ver é como certo instante da embriaguez: os pés não tocam a terra.
– Como a gente respira fundo em Brasília. Quem respira começa a querer. E querer é que não pode. Não tem. Será que vai ter? É que não estou vendo onde.
– Não me espantaria cruzar com árabes na rua. Árabes antigos e mortos.
– Aqui morre minha paixão. E ganho uma lucidez que me deixa grandiosa à toa. Sou fabulosa e inútil, sou de ouro puro. E quase mediúnica.
– Se há algum crime que a humanidade ainda não cometeu, esse crime novo será aqui inaugurado. E tão pouco secreto, tão bem adequado ao planalto, que ninguém jamais saberá.
– Aqui é o lugar certo onde o espaço mais se parece com o tempo.”
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